sábado, 4 de maio de 2024

A fome

Quem atravessa a Rua Cruz de Pedra, lá é tudo feio: automóveis atravancados como metal pedregoso ao sol; casas de um raquitismo desmaiado, outras reformuladas sem generosidade. Mas quem desemboca no Campo das Hortas, onde já a Sé encima, o Sol abre para um jardim parcamente florido, e a atmosfera, então saturada de construções arruinadas, dá para a uma catarse de ar fresco, onde não muito longe eu vislumbro a Porta Nova. Restaurantes pululam ali como nunca antes; nota-se o aroma das refeições vespertinas entre fogalhas e frenesi. Avanço para a rua dos Biscainhos. Uns passos em diante transpomos o Arco. Fervilha deste lado saúde e mercantilismo. E a Praça Velha, soalheira e vespertina, onde emboca a pitoresca Rua da Violinha. Todavia, nesse dia estaquei.

Nesse dia, combinei almoçar com o meu pai. O meu pai trabalhava na Biblioteca Municipal num gabinete para ele. Sim, era funcionário adstrito à Universidade do Minho. Após décadas nos pavilhões de marcenaria, foi convidado para servir no Arquivo Distrital. Trabalhou no Arquivo uma década. O seu trabalho consistia em averiguar o estado material da casa e seu Aprovisionamento. Simplesmente deixou de praticar Marcenaria propriamente dita nos pavilhões em Gualtar. Lembro-me perfeitamente do pavilhões aquando da infância. Bem, acordou com o próprio reitor para ingressar do Largo do Paço. Para mim, era algo pouco promissor. Eu adorava os pavilhões. Fora lá que eu pintei a minha pasteleira cor de laranja... ou como eu, no mesmo ano em que ingressei em Aveiro, desci a lameira ali próximo com ela cheio de uma grande alegria. No entanto, estava perto de casa, no Centro Histórico de Braga. 

Parece que estou em casa enfastiado, sem ânimo para ir ao Largo do Paço: «Merda!» Além disso, o meu pai estava numa fase muito contraditória. Sentia-se frustrado. Estava assim a modos que autoritário. Saí, portanto, e «Fervilha deste lado saúde e mercantilismo. E a Praça Velha, soalheira e vespertina, onde emboca a pitoresca Rua da Violinha. Todavia, nesse dia estaquei». No vidro de uma montra, vi o meu próprio reflexo. Era doentia, anti-natural. Eu estava enfezado, como que moribundo. Sei que voltei para casa. Não fui como combinado.

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