Silêncio de velório. Enquanto corto o tecido, e lhe dou cola para não desfiar as pontas, o diálogo suspende-se, indeterminadamente, quebrando a vida das palavras que animam o atelier de costura. Até o choro das carpideiras, que só existem hoje em dia no imaginário do povo, seria suficiente para alegrar as horas que passam. E já que o ambiente remonta a funerais, conto-vos que carreguei muitos caixões ao longo da vida.
Primeiro vai um. Depois vai outro. E pouco a pouco os entes queridos vão partindo. Até que um dia ficamos sós. Ficamos só nós num mundo descabido e sem graça.
Rosto a rosto, corpo a corpo, as tampas fecham-se. Flores e lágrimas. Depois a vida prossegue como se nada fosse. E no fundo a morte não é nada. Para muitos ao fim de poucos anos já os caixões carregados são só uma memória longínqua.
Na realidade a morte só tem impacto porque estamos vivos. E se estamos vivos nada mais resta senão esquecê-la e viver o tempo que ainda temos pela frente.
Neste silêncio de velório o trabalho prossegue. E nisto são horas de tomar café.